Uma perspectiva do devido processo legal sob o enfoque da dignidade da pessoa humana
O princípio do devido processo legal encontra previsão no art. 5º, inciso LIV, da Constituição da Republica de 1988. Cuida-se de mandamento constitucional de expressão lata, cujo significado semântico não se limita ao seu mero aspecto formal. Os Estados Unidos da América adotaram tal princípio em suas vertentes formal e material, e os fizeram por meio de uma Emenda Constitucional.
Uma vez que os Americanos são concisos na expressão verbal, extraíram do devido processo legal o máximo de carga semântica, conferindo-lhe matriz hermenêutica que ultrapassa a simples interpretação gramatical. Nesse sentido, o princípio não se presta somente à garantia de observância das leis para a concretização e instrumentalização do processo, mas, muito além disso, assegura o equilíbrio entre o poder punitivo do Estado e os danos causados por ele.
Com o arvorecer da globalização, o direito brasileiro recebeu influências das supremas cortes estrangeiras, notadamente da Suprema Corte Americana e do Tribunal Federal da Alemanha.
O devido processo legal em seu aspecto formal
O aspecto formal do devido processo legal em muito se aproxima do próprio princípio da legalidade. Em suma, cuida-se do respeito formal à lei. Ainda que de modo geral, todo procedimento deve estar legalmente previsto. Trata-se de uma vertente iniciada no processo penal que, posteriormente, expandiu-se às demais áreas do direito. O Código Civil determina, por exemplo, que, para a expulsão de um associado, necessária é a observância do devido processo legal, a teor do art. 57 do referido diploma.
No mesmo sentido, deve haver uma completude ritualística, de modo que a marcha processual se destine a uma finalidade cuja interrupção só se mostrará legítima em casos excepcionais, a exemplo do falecimento do réu ou de eventual absolvição sumária.
Em suma, conforme leciona Aury Lopes Jr., forma é garantia, e justamente no devido processo legal reside o núcleo desse conceito.
Nas palavras do Professor Processualista:
Quando se lida com o processo penal, deve-se ter bem claro que, aqui, forma é garantia. Por se tratar de um ritual de exercício de poder e limitação da liberdade individual, a estrita observância das regras do jogo (devido processo penal) é o fator legitimante da atuação estatal. Nessa linha, os princípios constitucionais devem efetivamente constituir o processo penal.
Passa-se doravante à análise do devido processo legal em seu aspecto material, cuja proporcionalidade constitui-se como o epicentro na leitura de interpretação conforme a Constituição.
O devido processo legal em seu aspecto material
O aspecto material caracteriza-se pelo enfoque em regras de justiças consubstanciadas no due process of law, com especial destaque para a incidência da noção de dignidade da pessoa humana.
Com efeito, o núcleo do devido processo legal material reside na proporcionalidade, cuja proposta possui como finalidade corrigir eventuais desvios no estrito cumprimento da lei. A função precípua do devido processo legal é, portanto, a garantia de um processo justo. A proporcionalidade, então, surge como o fiel da balança com vistas a evitar excessos por parte do poder punitivo estatal.
Um bom exemplo dessa premissa é a construção dogmática do princípio da insignificância, a concretizar um legítimo aspecto do devido processo legal material. Uma de suas funções é exatamente evitar que o Estado mostre seu poder quando deveria dele se afastar. O princípio da insignificância, portanto, surge como um fator limitante à penalização do ilícito mínimo ou pouco relevante do ponto de vista penal.
Uma vez mais, cuida-se do restabelecimento do equilíbrio entre o poder político do Estado e os danos causados por ele próprio. Nesse sentido, “de minimis non curat praetor”, ou, em tradução livre, “do pouco não deve o juiz se importar”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 83.